Construindo um roteiro semi-estruturado em 4 etapas

Láisa Rebelo
5 min readJun 9, 2023
Unplash — Kenny Eliason

Interagir com pessoas é algo inerente aos seres humanos, somos seres sociais, certo? Pensando assim, tecer uma conversa com pessoas usuárias para alcançar um objetivo pode até parecer simples. Mas, sem um roteiro a sua entrevista pode virar um bate-papo sem objetivo, que pode ser até divertido, mas você só vai jogar conversa fora.

Por isso, para que os minutos preciosos de pesquisa sejam bem aproveitados é imprescindível ter uma estrutura de perguntas para te guiar nessa conversa. Essas perguntas serão como uma bússola, que vão ajudar a direcionar a conversa precisa ir. Na metodologia de pesquisa, essa estrutura é o que se chama de roteiro semi-estruturado.

Detalhei em 4 etapas o meu processo de construção de roteiro para explicar como eu costumo desenvolver:

Primeiro passo: definir o objetivo da pesquisa e saber quais são os objetivos da entrevista.

Para desenvolver um roteiro de uma entrevista, independente de ser semi-estruturado ou não, é fundamental ter o objetivo principal da sua pesquisa bem definido. Assim, você vai ter em mente quais são as saídas esperadas da sua entrevista. Inclusive, essa reflexão pode contribuir para justificar o uso desse método de pesquisa.

Então questiono: "O quê eu quero responder com essa pesquisa?". Essa questão pode ocasionar em uma outra pergunta, que me direciona para a "pergunta norteadora" que vai guiar a pesquisa.

Com o objetivo claro o próximo passo é questionar sobre quais são as saídas (outputs) esperadas daquela conversa. Costumo começar a desenvolver as perguntas perguntando: "O que eu quero extrair com essa conversa?” Com essa pergunta em mente consigo começar a elaborar o objetivo da entrevista.

Segundo passo: desenvolver perguntas para o roteiro

Definido o objetivo da pesquisa e da entrevista, consigo seguir para etapa de desenvolvimento das questões. Novamente faço questionamentos e sigo refletindo: "O que eu quero saber com essa pergunta?"

Vou desenvolvendo as perguntas refletindo sobre o assunto, sem tolher o processo criativo. Para acompanhar se estou cumprindo os meus objetivos, construo em planilha duas colunas “Perguntas e tópicos”, desse modo, vou mantendo o fluxo criativo dentro do meu escopo. Começo pelas perguntas e depois analiso observando os outputs de cada uma.

Exemplo de construção de planilha de perguntas — Arquivo Pessoal

Terceiro passo: agrupar os assuntos e reduzir o roteiro.

Com as perguntas feitas, releio cada uma e vou agrupando as mais semelhantes para conseguir reduzir a quantidade de perguntas e deixar meu roteiro o mais enxuto possível. Quando se trata de um roteiro semi-estruturado as perguntas serão uma direção, ao longo da conversa quem faz a entrevista precisa ter atenção para fazer perguntas a partir da fala da pessoa entrevistada. A estrutura não deve ser rígida.

Quarto passo: construir a narrativa

Para que a conversa tenha um ritmo, é fundamental que as perguntas se complementem. Gosto de usar a analogia de uma costura, porque é preciso encontrar o fio que vai encadeando as perguntas para que a conversa faça sentido e consiga construir uma linha de raciocínio. Com uma estrutura que faça sentido, a entrevista consegue fluir mais próxima de uma conversa e com mais espontaneidade.

Pronto, com o roteiro estruturado considere consultar seus pares para receber um feedback. A primeira entrevista é crucial, caso alguma pergunta não esteja fazendo sentido, reflita se é preciso modificar. Se apegue ao roteiro, mas nem tanto. Lembre-se, é só um guia da entrevista, não torne a conversa rígida!

Bônus track #1: Dicas de entrevista

Não existe uma fórmula pronta, acredito que agir da forma como você se sente mais confortável é fundamental para que a conversa flua. Desde que você seja gentil e escute com atenção as pessoas, elas querem ser ouvidas por você.

Bônus track #2: Recrutamento

Quando vou convidar alguém para uma entrevista costumo falar que é uma conversa, entrevista pode trazer uma rigidez, um receio. No convite, reforço que eu quero ouvir a pessoa, e não peço que ela me ajude na minha pesquisa. Acredito que as pessoas gostam de ser ouvidas, ainda mais se for para falarem sobre algum problema e reclamação, mais do que querem ajudar marcas.

Afinal, não é a pessoa usuária que vai nos ajudar a resolver um problema. Somos nós, pesquisadoras, que temos como função ajudá-las, escutando e entendendo o que elas precisam, o que elas querem e quais são seus problemas.

Por isso, o tom do convite que gosto de fazer é sobre conversar e ouvir, aprender com as pessoas. Algumas entrevistas já viraram desabafos, quase uma terapia, por isso o roteiro é importante, ajuda a voltar para o caminho. (só não faça uma retomada brusca). Afinal, mapear problemas e identificar necessidades faz parte do processo de pesquisa, antes de validar ou refutar uma hipótese.

Por fim, algumas considerações

Fazer uma Matriz CSD (Certas, Suposições e Dúvidas) vai ajudar a entender o contexto e enriquecer o processo de desenvolvimento de perguntas. Esta etapa é interessante ser construída com outras pessoas envolvidas no projeto.

Dito isso, um resumo do passo a passo para desenvolver o roteiro:

#1 Entender qual é o objetivo daquela entrevista
Mas, será que antes de ir em busca de uma validação não seria interessante fazer uma pesquisa exploratória?

#2 Chuva de perguntas
Com o objetivo em mente, elabore perguntas que possam te ajudar a entender o contexto da pessoa usuária, mapear as dores, explorar a situação e, atender às perguntas da sua Matriz CSD.

#3 Classificação de perguntas
Fazer uma classificação, com um simples #hashtags como #UX #contexto #produto #dores #dados ajuda a identificar se você está focando em mais um grupo de perguntas que outro.

#4 Refinamento
Definir quais são as perguntas que deverão ficar no roteiro pelo agrupamento de temas afins e dar cadência para as perguntas, entrelaçando os assuntos.

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P.S.:

Gosto de pensar que UX Research tem o papel de advogar pelas pessoas no projeto. Me vejo como responsável por fazer o elo entre pessoas, negócios e tecnologia.

Além de entender as usuárias, o meu papel é conseguir estabelecer um equilíbrio entre todas as partes envolvidas para garantir que negócios e pessoas consigam ter suas expectativas e necessidades atendidas.

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Láisa Rebelo

UX Researcher @GrupoBoticário | Mestre em Design (UnB) - Design, Sociedade e Cultura | UX Design | Consumption | Anthropocene | Utopia | Menstruation